COMO DEMITIR SEM CAUSAR RAIVA E TRAUMA NO FUNCIONÁRIO

Com as incertezas e turbulências na economia, vêm as demissões. Com uma busca rápida, é possível encontrar facilmente grandes empresas, de diversos setores, que promoveram cortes significativos de pessoal desde o começo do ano. O processo é sempre doloroso para todos os envolvidos, mas, de acordo com especialistas, existem práticas que minimizam o impacto em quem é demitido, no gestor que demite, na imagem da empresa e nos colegas que permanecem.

Apesar de ainda serem poucas as empresas que investem em uma demissão responsável, vale ressaltar que as consequências de um processo mal conduzido vão desde constrangimento e mal-estar até a paralisação do profissional demitido que, ao ser desligado, fica remoendo a raiva da empresa e não consegue seguir adiante. Além disso, informações negativas sobre o ambiente de trabalho daquela organização podem se espalhar no mercado, o que influencia contratações futuras e traz queda na produtividade dos que ficam. “Entre 35% e 40% das ações trabalhistas são motivadas por mágoa”, afirma Rafael Souto, diretor geral da Produtive, consultoria de outplacement e planejamento de carreira.

A fabricante americana de máquinas agrícolas AGCO é uma das que investe na condução de um processo de demissão responsável. “Levamos os valores da empresa de respeito e integridade também para o momento em que o ciclo de um profissional é encerrado na companhia”, afirma Sheila Fonseca, diretora de recursos humanos da empresa no Brasil. Mesmo quando precisa dispensar um grande número de pessoas de uma só vez – como aconteceu em novembro passado -, a multinacional procura seguir um procedimento que ameniza os impactos da demissão.

Sheila explica que, primeiro, é feito um cuidadoso processo para analisar o desempenho de cada funcionário e a reestruturação da área. “Avaliamos as competências individualmente para mantermos as pessoas que vão se adaptar melhor à nova estrutura”, afirma. Depois, esse processo é comunicado ao demitido pelo gestor direto. “O funcionário que está saindo precisa saber que a escolha dos nomes seguiu um critério, não foi aleatória”, diz.

Os gestores, por sua vez, recebem periodicamente treinamentos que mostram como conduzir um processo dessa natureza. Antes de grandes desligamentos, também passam por um reforço para alinhar, entre outras coisas, a comunicação que será feita em todas as plantas que a empresa tem no Brasil.

Na estratégia de comunicação dos cortes entra também a figura do CEO. Sheila diz que, antes de qualquer desligamento de maiores proporções, o executivo solta um comunicado informando todos os funcionários sobre a situação da companhia e pede que sugiram práticas para ajudar no corte de custos. Há também outro comunicado, um dia antes da demissão, informando o fato. Depois que todos foram desligados – em reuniões individuais, não importa o número de profissionais envolvidos -, há um terceiro comunicado, dizendo que o processo foi encerrado naquele momento.

A AGCO oferece alguns benefícios aos que estão saindo, como extensão do plano de saúde por até um ano, orientação de carreira e outplacement – um serviço de recolocação para profissionais com cargos de gestão. “A demissão sempre é um momento ruim, mas procuramos oferecer uma estrutura básica para o profissional se reorganizar e manter o melhor ambiente possível para os que ficam”, diz Sheila.

Um levantamento feito pela Produtive mostra que a principal frustração dos demitidos não está na dispensa em si, mas na forma como o processo foi conduzido. “A demissão precisa ser planejada, explicada e comunicada adequadamente”, afirma José Augusto Minarelli, presidente da Lens & Minarelli, especializada em outplacement.

É importante, por exemplo, reservar uma sala para comunicar a demissão, para que o funcionário não se sinta exposto perante os colegas. Na reunião, um roteiro simples e direto deve ser seguido: informar sobre a decisão, apresentar de forma transparente o motivo do desligamento, agradecer a contribuição e reconhecer o trabalho prestado até o momento. Por fim, dar as informações sobre os benefícios, de como proceder a partir dali em relação a questões burocráticas e oferecer ajuda para tirar as dúvidas.

Minarelli diz que a conversa não costuma passar de dez minutos, mas é preciso reservar um espaço maior na agenda – até uma hora. “O gestor precisa ter o tempo necessário para acolher a reação do demitido”, diz. Estar preparado para compreender a reação emocional de quem está sendo desligado, aliás, é fundamental para o bom andamento do processo. “Sob emoção, as pessoas se comunicam de forma errada. Não é o momento de dar feedback, tentar ser bonzinho, prometer uma recontratação assim que possível ou dizer que o profissional é muito bom e logo vai se recolocar. É o momento de ouvir, dizer que entende, acolher e confirmar que a decisão está tomada.”

Cristina Fortes, consultora sênior de transição de carreira da consultoria LHH, concorda que falar demais é uma das principais falhas do gestor que demite. Além disso, ela cita outros problemas, como a falta de integridade do discurso – “eu não gostaria de desligar você, mas é uma decisão da empresa” -, emocionar-se junto com o demitido e não saber informar os próximos passos – é preciso devolver o celular, o carro e o notebook imediatamente?

A comunicação da demissão, ressalta, é a última etapa de um processo. De acordo com Célio Pinto, consultor e sócio da Search, quando os chefes dão feedbacks continuamente, a demissão fica muito mais fácil caso o motivo seja o baixo desempenho.

Esse era um dos maiores problemas enfrentados pela DHL. Cerca de seis meses atrás, a multinacional americana implementou um programa interno chamado Plano de Desenvolvimento de Performance (PDP). Isso porque muitos funcionários chegavam à entrevista de desligamento, que acontece com o RH após a conversa com o gestor, dizendo estarem surpresos com o fato. “Identificamos uma oportunidade de aperfeiçoar os processos de feedback”, afirma Kelly El Kadi, diretora de recursos humanos da DHL Express.

A multinacional já fazia, e ainda faz anualmente, o processo mais tradicional de avaliação de desempenho com todos os funcionários. Mas observou que os feedbacks não estavam sendo compreendidos por alguns. “Eles não percebiam que aquele retorno era um aviso de uma demissão iminente caso não houvesse mudança”. Agora, para cada funcionário com desempenho insatisfatório, é aberto um PDP. O programa dura três meses, mas pode ser mais curto ou se estender um pouco dependendo da situação.

No começo do PDP é feita uma descrição explicando porque aquele funcionário está ingressando no programa. “Apresentamos fatos, dizemos as falhas que vêm ocorrendo. É algo para formalizar a situação”, diz Kelly. Depois, o funcionário vai recebendo feedbacks semanais ou quinzenais sobre sua evolução.

Cristina, da LHH, enfatiza que existe um mito de que qualquer pessoa sabe demitir, mas um processo responsável e benfeito está nos detalhes. Para Minarelli, o assunto ainda é tabu no Brasil e, por isso, não é discutido como deveria. “É um tema delicado porque nós, latinos, nos sentimos culpados ao demitir. Entendemos que estamos tirando o emprego de um amigo. Além disso, temos dificuldade em falar a verdade sobre o desempenho das pessoas”, diz o consultor. Em sua opinião, o processo de demissão deveria ser discutido em programas de liderança e ser tratado de forma mais rotineira nos treinamentos dos gestores.

Souto, da Produtive, ressalta que treinamentos específicos sobre demissão ministrados aos líderes têm também outra função, que é a de lidar com o sofrimento do gestor encarregado para fazer o desligamento. “Ele precisa se sentir mais seguro e saber o que vai falar”, afirma.

Fonte: Valor Econômico, por Adriana Fonseca,

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